POESÓ
TUDO PODE VIRAR PÓ
OU
POEMA
OU
POEMA
sexta-feira, 26 de julho de 2019
quinta-feira, 25 de julho de 2019
quarta-feira, 24 de julho de 2019
terça-feira, 23 de julho de 2019
HASTAG
PRECISA DE ETIQUETA
PRÁ COMER COM PAUZINHOS
PRÁ ENTRAR NO JOGO DA VELHA
PRÁ ESTICAR AS CANELAS
PRA CAIR NA SARJETA
PRÁ PENSAR SÓ EM UMA
E BEBER TODAS ELAS
PRECISA DE ETIQUETA
O QUE ESTÁ TÃO FLAGRANTE
E NÃO SUPORTA
NENHUMA IMPOSIÇÃO
NEM MESMO UM FRÁGIL BARBANTE?
PRÁ COMER COM PAUZINHOS
PRÁ ENTRAR NO JOGO DA VELHA
PRÁ ESTICAR AS CANELAS
PRA CAIR NA SARJETA
PRÁ PENSAR SÓ EM UMA
E BEBER TODAS ELAS
PRECISA DE ETIQUETA
O QUE ESTÁ TÃO FLAGRANTE
E NÃO SUPORTA
NENHUMA IMPOSIÇÃO
NEM MESMO UM FRÁGIL BARBANTE?
Carlos Roberto Gutierrez
poema Visual Tonho
Quiçá raízes
RANHURAS
RACHADURAS
TALHES
QUE APURAS
ÀS MAIS RIGOROSAS INTEMPÉRIES
E IMPLACÁVEIS VENDAVAIS
A AÇÃO DO TEMPO
FRAGMENTOS
DO QUE AINDA SE PRESUME ÁRVORE
CASCA LASCAS
OCRE MÁRMORE
E AINDA PRODUZ
SOB TODA A LUZ
SOMBRAS PARA SERENAR
OS PENSAMENTOS
FILAMENTOS
OLHOS QUE BROTAM
LÁBIOS GRAVADOS
EM BRAÇOS DE GALHOS
EM RETALHOS SOBREPOSTOS
EM CONTRASTES
COM TIJOLOS APARENTES
E TELHAS QUE UM DIA
JÁ FORAM ARGILA
QUIÇÁ RAÍZES
RACHADURAS
TALHES
QUE APURAS
ÀS MAIS RIGOROSAS INTEMPÉRIES
E IMPLACÁVEIS VENDAVAIS
A AÇÃO DO TEMPO
FRAGMENTOS
DO QUE AINDA SE PRESUME ÁRVORE
CASCA LASCAS
OCRE MÁRMORE
E AINDA PRODUZ
SOB TODA A LUZ
SOMBRAS PARA SERENAR
OS PENSAMENTOS
FILAMENTOS
OLHOS QUE BROTAM
LÁBIOS GRAVADOS
EM BRAÇOS DE GALHOS
EM RETALHOS SOBREPOSTOS
EM CONTRASTES
COM TIJOLOS APARENTES
E TELHAS QUE UM DIA
JÁ FORAM ARGILA
QUIÇÁ RAÍZES
Carlos Roberto Gutierrez
]foto Sonia Brandão
Falha de Memória
falha de memoria
Só sei que eu a encontrei
não sei bem onde
dentro de um vagão de trem
ou de um obsoleto bonde
dentro de um vaso solitário
ou de um copo improvisado
eu a encontrei em alguns
desses estados
mas ela estava intacta
esperando o beijo colibri
eu a vi assim
brotar de um sonho enfim
com as suas delicadas pétalas
e o seu doce perfume
sem queixumes
ou ciúmes
de uma abelha sequer
eu a encontrei enfim
num imenso jardim
vestida levemente violeta
foi a ultima que eu vi
se me lembro bem
e a mais linda que beijei!
não sei bem onde
dentro de um vagão de trem
ou de um obsoleto bonde
dentro de um vaso solitário
ou de um copo improvisado
eu a encontrei em alguns
desses estados
mas ela estava intacta
esperando o beijo colibri
eu a vi assim
brotar de um sonho enfim
com as suas delicadas pétalas
e o seu doce perfume
sem queixumes
ou ciúmes
de uma abelha sequer
eu a encontrei enfim
num imenso jardim
vestida levemente violeta
foi a ultima que eu vi
se me lembro bem
e a mais linda que beijei!
Carlos Roberto Gutierrez
Estranha Fruta
estranha fruta
essa que a gente desfruta
na melancolia
ácida nos olhos
amarga na boca
estranha fruta
que diferente da flor
ostensiva no cabelo
esse jardim noturno
se esconde
oculta como um caroço
descrente ainda como uma semente
essa que a gente desfruta
na melancolia
ácida nos olhos
amarga na boca
estranha fruta
que diferente da flor
ostensiva no cabelo
esse jardim noturno
se esconde
oculta como um caroço
descrente ainda como uma semente
Carlos Roberto Gutierrez
O Amor é Bandoleiro
colando frases...
o amor é bandoleiro
e permite sucessivos tiroteios
todas armas e artimanhas
todas argúcia sem bloqueios
o amor é bandoleiro
vive de tiroteios
balas de todos calibres
e todos sabores
balas certeiras e ingênuas
balas de festim e de verdade
doces azedas ácidas fatais
o amor é bandoleiro
quem há de se expor inteiro
quem há de se expor primeiro
e encarar o duelo
a cilada o elo perdido
a emboscada
á cápsula deflagrada
o amor é bandoleiro
vive foge e se encontra em bandos
nos desígnios dos desejos
na febre das estações
e permite sucessivos tiroteios
todas armas e artimanhas
todas argúcia sem bloqueios
o amor é bandoleiro
vive de tiroteios
balas de todos calibres
e todos sabores
balas certeiras e ingênuas
balas de festim e de verdade
doces azedas ácidas fatais
o amor é bandoleiro
quem há de se expor inteiro
quem há de se expor primeiro
e encarar o duelo
a cilada o elo perdido
a emboscada
á cápsula deflagrada
o amor é bandoleiro
vive foge e se encontra em bandos
nos desígnios dos desejos
na febre das estações
Carlos Roberto Gutierrez
O tempo passa pássaro
Pétalas que ficam
O tempo passa
mas nem tudo se modifica
resistem paisagens
mesmo em lentes oblíquas
persistem lembranças
em sabores silvestres de infância
perfumes bilhetes e certos vinis
na juventude na amplitude
do que ainda pode vir
na maturidade
O tempo passa
devemos existir
enquanto possamos consentir
e permitir colher a flor do campo
cuidar do musgo sem resmungo
do muro em que habita
assim como de um jardim
que pareça não ter fim
O tempo passa
mas uma rosa sobrevive e desabrocha
em seus lábios carmim
assim como uma pétala em cada aro
dos seus óculos
onde ainda preparo um poético olhar
o tempo passa...pássaro
mas nem tudo se modifica
resistem paisagens
mesmo em lentes oblíquas
persistem lembranças
em sabores silvestres de infância
perfumes bilhetes e certos vinis
na juventude na amplitude
do que ainda pode vir
na maturidade
O tempo passa
devemos existir
enquanto possamos consentir
e permitir colher a flor do campo
cuidar do musgo sem resmungo
do muro em que habita
assim como de um jardim
que pareça não ter fim
O tempo passa
mas uma rosa sobrevive e desabrocha
em seus lábios carmim
assim como uma pétala em cada aro
dos seus óculos
onde ainda preparo um poético olhar
o tempo passa...pássaro
Carlos Roberto Gutierrez
segunda-feira, 22 de julho de 2019
Partilha
poema em forma de partilha
Partilha a minha mão
os meus dedos
que se livraram de todos os medos
quando decidiram
dedicar a você
os mais profundos e sinceros versos
Partilha a minha mão elegante
os meus dedos longos de poeta
que tateiam a sua doce lembrança
e acariciam papéis de seda ou de pão
para alegrar o coração
Partilha a minha ilha
e a transforme em universo
não importa o espaço
o limite tirano do tempo
pode caber num simples verso
numa solitária palavra
ou num poema infinito...
pelas unhas eu grito
e quando as toco em meus lábios
nem no silêncio
desisto...
todo o roer da saudade
Partilha a minha mão
os meus dedos
que se livraram de todos os medos
quando decidiram
dedicar a você
os mais profundos e sinceros versos
Partilha a minha mão elegante
os meus dedos longos de poeta
que tateiam a sua doce lembrança
e acariciam papéis de seda ou de pão
para alegrar o coração
Partilha a minha ilha
e a transforme em universo
não importa o espaço
o limite tirano do tempo
pode caber num simples verso
numa solitária palavra
ou num poema infinito...
pelas unhas eu grito
e quando as toco em meus lábios
nem no silêncio
desisto...
todo o roer da saudade
Carlos Roberto Gutierrez
sexta-feira, 19 de julho de 2019
quinta-feira, 18 de julho de 2019
Emaranhado
RUMOS E RUMORES
REDES APRAZÍVEIS E DE INTRIGAS
TEIAS FLEXÍVEIS E ARACNÍDEAS
HUMORES E TUMORES
ATALHOS E LABIRINTOS
RISCOS DE VIDA E VÍTREOS
MAPAS GPS OU QUE SE ESQUECE ÍNTIMO
FIOS DE HORIZONTES
INFINITOS E ÍNFIMOS
AGULHAS NOS PALHEIROS
KRIPTON
REFLEXOS DE GRITOS
NO EMARANHADO ESPELHO
EM QUE ME FITO FIXO
E VEJO NÍTIDO
TODA A MINHA INCONSTÂNCIA
REDES APRAZÍVEIS E DE INTRIGAS
TEIAS FLEXÍVEIS E ARACNÍDEAS
HUMORES E TUMORES
ATALHOS E LABIRINTOS
RISCOS DE VIDA E VÍTREOS
MAPAS GPS OU QUE SE ESQUECE ÍNTIMO
FIOS DE HORIZONTES
INFINITOS E ÍNFIMOS
AGULHAS NOS PALHEIROS
KRIPTON
REFLEXOS DE GRITOS
NO EMARANHADO ESPELHO
EM QUE ME FITO FIXO
E VEJO NÍTIDO
TODA A MINHA INCONSTÂNCIA
Carlos Roberto Gutierrez
Foto Nelson de Souza
Limonada
LIMONADA
LIMO...NADA?
NADA...LIMO...RIMO...TUDO
DOCE...AZEDO...CORAGEM E MEDO
AFOGAR E SEDE
CÍTRICO CRÍTICO
LIMO NADA
LEMBRO TUDO
DA SEDE PASSADA
DO AFOGAR FUTURO
NADA...LIMO...RIMO...TUDO
DOCE...AZEDO...CORAGEM E MEDO
AFOGAR E SEDE
CÍTRICO CRÍTICO
LIMO NADA
LEMBRO TUDO
DA SEDE PASSADA
DO AFOGAR FUTURO
Carlos Roberto Gutierrez
Túnel
NÃO LHE VEJO NO FINAL DO TÚNEL
TENHO APENAS A VAGA LEMBRANÇA
DE UMA ABERTURA DE UMA CAVIDADE
DE UM OLHAR QUE FLUTUA NO TEMPO
NÃO LHE VEJO NO FINAL DO TÚNEL
O TONER DA XEROX JÁ NÃO ESPIRRA
LÁGRIMAS NEGRAS PARA REVELAR
TODA A SUA ANTIGA LUMINOSIDADE
NÃO LHE VEJO NO FINAL DO TÚNEL
E ATORDOADO FICO CISMADO
SE AINDA É TÚNEL OU TÚMULO DISSIMULADO
TENHO APENAS A VAGA LEMBRANÇA
DE UMA ABERTURA DE UMA CAVIDADE
DE UM OLHAR QUE FLUTUA NO TEMPO
NÃO LHE VEJO NO FINAL DO TÚNEL
O TONER DA XEROX JÁ NÃO ESPIRRA
LÁGRIMAS NEGRAS PARA REVELAR
TODA A SUA ANTIGA LUMINOSIDADE
NÃO LHE VEJO NO FINAL DO TÚNEL
E ATORDOADO FICO CISMADO
SE AINDA É TÚNEL OU TÚMULO DISSIMULADO
Carlos Roberto Gutierrez
João Ubaldo
Luis Fernando Verissimo : "João Ubaldo era o mais delicioso dos escritores brasileiros"
Um laço entre Canudos e a Grécia clássica
Não são muitos os escritores que antes dos 30 anos alcançam produzir uma obra-prima e serem reconhecidos como grandes. João Ubaldo é um deles: nascido em 41, exatos trinta anos depois publicou Sargento Getúlio, um romance breve e marcante que está no repertório definitivo dos grandes feitos da literatura em português.
Quase se pode dizer que o resto de sua obra faz papel coadjuvente - e são alguns outros romances, entre os quais despontam um sucesso de público, Viva o povo brasileiro(1984), e uma novela de escândalo calculado, A casa dos budas ditosos (1999), além de crônicas de ampla leitura. A força principal dessa obra "auxiliar" vem de um sentido claro de irreverência, de deboche, de sátira a valores que, bem pensadas as coisas, terão pouca relevância para as novas gerações: para João Ubaldo, os inimigos mentais são a moral católica, a história oficial, a arrogância das elites, e os aliados pertencem a uma permanente crença na força desmistificadora do povo simples.
O caso é que Sargento Getúlio renova a força de uma excelente tradição brasileira (não só - na verdade, é característica de países e regiões periféricas à Europa Ocidental) - a tradição do romance testemunhal, narrado em primeira pessoa, que dá a palavra para um homem oriundo das camadas mais pobres e iletradas que entra em contato com o mundo do poder, armando para isso uma forma capaz de representar a linguagem e a visão de mundo de alguém cuja vida medeia entre dois mundos (sociais, políticos, intelectuais) opostos.
Antes dele, Graciliano Ramos e Guimarães Rosa despontam nessa família, a que podemos acrescentar o contista Simões Lopes Neto: Paulo Honório, Riobaldo e Blau Nunes antecedem Getúlio nessa condição. Esse sargento relata sua experiência definitiva - foi encarregado, por um chefe político da capital do sergipe, de conduzir um preso político de uma cidadezinha interiorana até Aracaju. Capanga à moda tradicional, Getúlio já matara mais de vinte, e agora executava essa nova tarefa.
Só que, no meio do percurso, ocorre algo que para ele é incompreensível: seu chefe vem a perder o poder, e o preso conduzido por Getúlio passa a ser alguém da situação. Mandam recado ao sargento para que libere o preso, mas Getúlio se nega, porque, afinal, palavra é palavra - a palavra dada, para um sertanejo como ele, vale mais que qualquer coisa, qualquer arranjo político. Mandam que ele liberte o sujeito e suma dali, e neste momento temos um dos momentos sublimes do romance, porque Getúlio não sabe, não concebe o sentido de fugir a uma missão assumida. "Como eu posso sumir, se eu sou eu?", ele se pergunta, num atestado ao mesmo tempo de honra e de anacronismo.
João Ubaldo é talvez o terceiro de sua geração a morrer: primeiro foram Caio Fernando Abreu e Moacyr Scliar. Todos eles cosmopolitas, praticantes da narrativa e forjados no mau tempo da ditadura militar e da revolução de costumes que veio com a pílula anticoncepcional e o rock'n'roll, o que imprimiu a seu horizonte uma marca de certa militância, ao mesmo tempo que obrigou à experimentação - todos eles se viram obrigados a arguir a forma, porque todos sabiam que já havia a sombra de grandes, como Guimarães Rosa ou Clarice Lispector.
Curiosamente, foi também um pensador nascido no Rio Grande do Sul quem propôs, no calor da hora da primeira metade dos anos 70, a mais significativa interpretação para a história de Getúlio: foi José Hildebrando Dacanal quem, em um estudo já clássico, A nova narrativa épica no Brasil (1973), apresentou uma hipótese ainda agora original - o Sargento Getúlio, ao lado de Grande sertão: veredas, de A pedra do reino(Ariano Suassuna), O coronel e o lobisomem (José Cândido de Carvalho) e Chapadão do bugre (Mário Palmério), seria o enunciado literário da transição entre uma visão de mundo mítica, marcada pela origem sertaneja, e a visão de mundo racional e crítica, característica do mundo moderno e urbano. Tais livros seriam o lado brasileiro de uma equação que alcança gente como Gabriel García Márquez, Juan Rulfo e outros hispano-americanos.
Em Sargento Getúlio há duas frases de abertura, como uma epígrafe de esclarecimento. A primeira informa: "Nesta história, o Sargento Getúlio leva um preso de Paulo Afonso a Barra dos Coqueiros". A segunda comenta, dando perspectiva ampla para o texto: "É uma história de aretê".
Aretê é conceito grego clássico, que descreve a virtude do sujeito que realiza sua essência, que alcança a excelência, como é o caso do herói épico. Assim se pode dizer que se passa com Getúlio? Sim, ele realiza talvez seu melhor, que porém é algo que o leva à morte, o que significa que a ele se poderia associar o conceito grego de certa forma oposto a aretê, a húbris, o descomedimento, a perda do sentido das proporções e das regras, algo que se associa não ao épico mas ao trágico.
Deste tamanho é a obra de João Ubaldo Ribeiro: ela leva o mundo sertanejo, a que não falta nem mesmo a menção à exterminada Canudos, no cap. V, até as alturas da grande tradição ocidental, à profundeza dos pilares da civilização ocidental, com a argamassa da vida forte e dura dos confins da América brasileira.
Um laço entre Canudos e a Grécia clássica
Não são muitos os escritores que antes dos 30 anos alcançam produzir uma obra-prima e serem reconhecidos como grandes. João Ubaldo é um deles: nascido em 41, exatos trinta anos depois publicou Sargento Getúlio, um romance breve e marcante que está no repertório definitivo dos grandes feitos da literatura em português.
Quase se pode dizer que o resto de sua obra faz papel coadjuvente - e são alguns outros romances, entre os quais despontam um sucesso de público, Viva o povo brasileiro(1984), e uma novela de escândalo calculado, A casa dos budas ditosos (1999), além de crônicas de ampla leitura. A força principal dessa obra "auxiliar" vem de um sentido claro de irreverência, de deboche, de sátira a valores que, bem pensadas as coisas, terão pouca relevância para as novas gerações: para João Ubaldo, os inimigos mentais são a moral católica, a história oficial, a arrogância das elites, e os aliados pertencem a uma permanente crença na força desmistificadora do povo simples.
O caso é que Sargento Getúlio renova a força de uma excelente tradição brasileira (não só - na verdade, é característica de países e regiões periféricas à Europa Ocidental) - a tradição do romance testemunhal, narrado em primeira pessoa, que dá a palavra para um homem oriundo das camadas mais pobres e iletradas que entra em contato com o mundo do poder, armando para isso uma forma capaz de representar a linguagem e a visão de mundo de alguém cuja vida medeia entre dois mundos (sociais, políticos, intelectuais) opostos.
Antes dele, Graciliano Ramos e Guimarães Rosa despontam nessa família, a que podemos acrescentar o contista Simões Lopes Neto: Paulo Honório, Riobaldo e Blau Nunes antecedem Getúlio nessa condição. Esse sargento relata sua experiência definitiva - foi encarregado, por um chefe político da capital do sergipe, de conduzir um preso político de uma cidadezinha interiorana até Aracaju. Capanga à moda tradicional, Getúlio já matara mais de vinte, e agora executava essa nova tarefa.
Só que, no meio do percurso, ocorre algo que para ele é incompreensível: seu chefe vem a perder o poder, e o preso conduzido por Getúlio passa a ser alguém da situação. Mandam recado ao sargento para que libere o preso, mas Getúlio se nega, porque, afinal, palavra é palavra - a palavra dada, para um sertanejo como ele, vale mais que qualquer coisa, qualquer arranjo político. Mandam que ele liberte o sujeito e suma dali, e neste momento temos um dos momentos sublimes do romance, porque Getúlio não sabe, não concebe o sentido de fugir a uma missão assumida. "Como eu posso sumir, se eu sou eu?", ele se pergunta, num atestado ao mesmo tempo de honra e de anacronismo.
João Ubaldo é talvez o terceiro de sua geração a morrer: primeiro foram Caio Fernando Abreu e Moacyr Scliar. Todos eles cosmopolitas, praticantes da narrativa e forjados no mau tempo da ditadura militar e da revolução de costumes que veio com a pílula anticoncepcional e o rock'n'roll, o que imprimiu a seu horizonte uma marca de certa militância, ao mesmo tempo que obrigou à experimentação - todos eles se viram obrigados a arguir a forma, porque todos sabiam que já havia a sombra de grandes, como Guimarães Rosa ou Clarice Lispector.
Curiosamente, foi também um pensador nascido no Rio Grande do Sul quem propôs, no calor da hora da primeira metade dos anos 70, a mais significativa interpretação para a história de Getúlio: foi José Hildebrando Dacanal quem, em um estudo já clássico, A nova narrativa épica no Brasil (1973), apresentou uma hipótese ainda agora original - o Sargento Getúlio, ao lado de Grande sertão: veredas, de A pedra do reino(Ariano Suassuna), O coronel e o lobisomem (José Cândido de Carvalho) e Chapadão do bugre (Mário Palmério), seria o enunciado literário da transição entre uma visão de mundo mítica, marcada pela origem sertaneja, e a visão de mundo racional e crítica, característica do mundo moderno e urbano. Tais livros seriam o lado brasileiro de uma equação que alcança gente como Gabriel García Márquez, Juan Rulfo e outros hispano-americanos.
Em Sargento Getúlio há duas frases de abertura, como uma epígrafe de esclarecimento. A primeira informa: "Nesta história, o Sargento Getúlio leva um preso de Paulo Afonso a Barra dos Coqueiros". A segunda comenta, dando perspectiva ampla para o texto: "É uma história de aretê".
Aretê é conceito grego clássico, que descreve a virtude do sujeito que realiza sua essência, que alcança a excelência, como é o caso do herói épico. Assim se pode dizer que se passa com Getúlio? Sim, ele realiza talvez seu melhor, que porém é algo que o leva à morte, o que significa que a ele se poderia associar o conceito grego de certa forma oposto a aretê, a húbris, o descomedimento, a perda do sentido das proporções e das regras, algo que se associa não ao épico mas ao trágico.
Deste tamanho é a obra de João Ubaldo Ribeiro: ela leva o mundo sertanejo, a que não falta nem mesmo a menção à exterminada Canudos, no cap. V, até as alturas da grande tradição ocidental, à profundeza dos pilares da civilização ocidental, com a argamassa da vida forte e dura dos confins da América brasileira.
*Professor, pesquisador e escritor
Meu Nome é Fome
MEU NOME
É FOME
SEM SOBRENOME
UM NOME AINDA
ANTES QUE SOME
E NENHUMA LETRA SOBRE
NA RALA SOPA DAS LETRAS
MEU NOME
É FOME
FALTA DE AFETO
DOCE PREDILETO
TOMADO PELO SAL AMARGO
MEU NOME
COMO É MESMO MEU NOME
MEU APELIDO
ESPREMIDO
CARÊNCIA
OU FALÊNCIA DE SENTIDOS
MEU NOME
É FOME
MEU SOBRENOME
SEDE TALVEZ
LEMBRANÇAS DE ALFABETO
CAÇA PALAVRAS
DICIONÁRIO MUTILADO
SEM O SEU NOME
SAUDADES
CUJO FONEMA
LEMBRA FOME
E AS SÍLABAS
A CHAVE DE VIVER
É FOME
SEM SOBRENOME
UM NOME AINDA
ANTES QUE SOME
E NENHUMA LETRA SOBRE
NA RALA SOPA DAS LETRAS
MEU NOME
É FOME
FALTA DE AFETO
DOCE PREDILETO
TOMADO PELO SAL AMARGO
MEU NOME
COMO É MESMO MEU NOME
MEU APELIDO
ESPREMIDO
CARÊNCIA
OU FALÊNCIA DE SENTIDOS
MEU NOME
É FOME
MEU SOBRENOME
SEDE TALVEZ
LEMBRANÇAS DE ALFABETO
CAÇA PALAVRAS
DICIONÁRIO MUTILADO
SEM O SEU NOME
SAUDADES
CUJO FONEMA
LEMBRA FOME
E AS SÍLABAS
A CHAVE DE VIVER
Carlos Roberto Gutierrez
sexta-feira, 12 de julho de 2019
GANCHO
UM GANCHO
ONDE DESMANCHO
OS MEUS PENSAMENTOS
E ARROGANTEMENTE
TENTO DESVENDAR
TODOS OS MISTÉRIOS
SER OU NÃO SER
RESPONDER ENTRE OS BALÕES
DO MEU GIBI SER
OU ENTRE AS NUVENS
DOS MEUS TEMORES
E O SOL DO MEU ESPAIRECER
UM GANCHO ME APANHA
E ACOMPANHA AS SOMBRAS
QUE SE DESMANCHAM
SEM SABER POR QUE?
ONDE DESMANCHO
OS MEUS PENSAMENTOS
E ARROGANTEMENTE
TENTO DESVENDAR
TODOS OS MISTÉRIOS
SER OU NÃO SER
RESPONDER ENTRE OS BALÕES
DO MEU GIBI SER
OU ENTRE AS NUVENS
DOS MEUS TEMORES
E O SOL DO MEU ESPAIRECER
UM GANCHO ME APANHA
E ACOMPANHA AS SOMBRAS
QUE SE DESMANCHAM
SEM SABER POR QUE?
Carlos Roberto Gutierrez
Deslumbrante
O que procura...o que procura...
nessa fresta
entre as arestas da cortina
e o vidro da janela
o que procura?
será talvez uma paisagem inédita
ou a luz que flutua na rua
comove os becos
e ilumina o caminhar noturno
o que procura?
será a ruptura de tudo
que circunda o seu mundo
as sombras e as sobras de luzes
o brilho da reflexão
Não posso ver a sua face
nem ouso ser importuno
vejo o seu reverso
a noite em seus cabelos escuros
e brilhantes
então não mais me procuro
me encontro
ainda quando busca
e em cada passo me deslumbra
nessa fresta
entre as arestas da cortina
e o vidro da janela
o que procura?
será talvez uma paisagem inédita
ou a luz que flutua na rua
comove os becos
e ilumina o caminhar noturno
o que procura?
será a ruptura de tudo
que circunda o seu mundo
as sombras e as sobras de luzes
o brilho da reflexão
Não posso ver a sua face
nem ouso ser importuno
vejo o seu reverso
a noite em seus cabelos escuros
e brilhantes
então não mais me procuro
me encontro
ainda quando busca
e em cada passo me deslumbra
Carlos Roberto Gutierrez
A Musicista e o Poeta
"A Musicista e o Poeta"
Mais do que um encontro
de sons e palavras
silêncios mútuos
contemplam saudades
de sons e palavras
silêncios mútuos
contemplam saudades
Ela ouve o que ele escreve
Ele lê os seus olhos profundos
e os seus traços suaves
e em versos a persegue
quando a percebe em seu coração
Ele lê os seus olhos profundos
e os seus traços suaves
e em versos a persegue
quando a percebe em seu coração
Ela é a música que sublima
a abstração divina
Ele é a letra que procura
a perfeita rima
para concreta se acomodar
nas lacunas das pauta dos seus encantos
[
a abstração divina
Ele é a letra que procura
a perfeita rima
para concreta se acomodar
nas lacunas das pauta dos seus encantos
[
Ela o inspira tanto...tanto
que os versos já vem prontos
e dispensam ensaios
Ela o inspira tanto
que ele consegue ouvir a sua doce voz
que os versos já vem prontos
e dispensam ensaios
Ela o inspira tanto
que ele consegue ouvir a sua doce voz
Ela música musa vem calma
dentro da alma
e acalma
os dedos de inquietude
com a virtuose virtude
para dar amplitude aos seus versos
dentro da alma
e acalma
os dedos de inquietude
com a virtuose virtude
para dar amplitude aos seus versos
Entre notas graves
de um contrabaixo em lamúrios
e notas agudas
de um violino apaixonado
palavras já não são mudas
nem escudos...
de um contrabaixo em lamúrios
e notas agudas
de um violino apaixonado
palavras já não são mudas
nem escudos...
sussurram de amor
Instantâneo
tipo assim
encontrando
ainda de pantufas roxas
toalha displicente no pescoço
cabelos em alvoroço
meio zonza
procurando um copo
e a água mineral
tipo assim
ainda dentro de um sonho
no bocejo das horas
com o batom derretendo
se dissolvendo
tal qual amoras
enquanto estojo de maquiagem
dorme coberto pelo espelho
encontrando
ainda de pantufas roxas
toalha displicente no pescoço
cabelos em alvoroço
meio zonza
procurando um copo
e a água mineral
tipo assim
ainda dentro de um sonho
no bocejo das horas
com o batom derretendo
se dissolvendo
tal qual amoras
enquanto estojo de maquiagem
dorme coberto pelo espelho
Carlos Roberto Gutierrez
NAMORO
NAMORO
NÃO MORO
DEMORO
NAMORO
NO MURO
DESMORONO
NAMORO
O INTERVALO
DO QUE GRITO
E DO QUE CALO
ENQUANTO O ABRAÇO
NÃO SUFOCA
ENQUANTO O BEIJO
NÃO RESSECA
NAMORO
NO FORO ÍNTIMO
ATÉ NÃO SENTIR
O SEU FORA
NAMORA
O QUE PACIFICA
E O QUE APAVORA
NAMORA NA MORAL
NO MURO DO FUTURO
NO MURRO DO PRESENTE
NO MEMORIAL SENTIMENTAL
DO PASSADO
NAMORA DESNAMORA
MORA NÃO MORA
NÃO DEIXE MORRER
ESSA HORA
cARLOS rOBERTO gUTIERREZ
NÃO MORO
DEMORO
NAMORO
NO MURO
DESMORONO
NAMORO
O INTERVALO
DO QUE GRITO
E DO QUE CALO
ENQUANTO O ABRAÇO
NÃO SUFOCA
ENQUANTO O BEIJO
NÃO RESSECA
NAMORO
NO FORO ÍNTIMO
ATÉ NÃO SENTIR
O SEU FORA
NAMORA
O QUE PACIFICA
E O QUE APAVORA
NAMORA NA MORAL
NO MURO DO FUTURO
NO MURRO DO PRESENTE
NO MEMORIAL SENTIMENTAL
DO PASSADO
NAMORA DESNAMORA
MORA NÃO MORA
NÃO DEIXE MORRER
ESSA HORA
cARLOS rOBERTO gUTIERREZ
Cais
cais
longe do caos
porto
conforto do olhar
sol
centro
bola de fogo
dentro
de um céu propício
para sonhar
cais
longe do caos
mais do que um paradeiro
plataforma
de sombras e luzes
para adequar
a paisagem
e a futura viagem
longe do caos
porto
conforto do olhar
sol
centro
bola de fogo
dentro
de um céu propício
para sonhar
cais
longe do caos
mais do que um paradeiro
plataforma
de sombras e luzes
para adequar
a paisagem
e a futura viagem
Carlos Roberto Gutierrez
quinta-feira, 11 de julho de 2019
Cortázar
Cortázar inspirou Godard
Júlio Cortázar foi enorme. Tinha cerca de dois metros de altura, mãos gigantescas e um fôlego maiúsculo que o levou a tocar trompete. Nasceu na embaixada da Argentina em Bruxelas e, aos quatro anos, retornou à terra de seus pais, de onde saiu em 1951 para se estabelecer em Paris e nunca mais voltar. Seus contos – muitos deles fantasiosos – seguem sendo adorados por uma legião de leitores. Suas histórias são multitemáticas, há jazz, gatos, velórios, portas que escondem segredos, tango, jogos, estradas… “A autoestrada do sul”, que é um de seus contos mais famosos, dá nome ao livro que, em poucos dias, chegará à Coleção L&PM Pocket. O livro traz este e mais sete contos selecionados por Sérgio Karam e com nova tradução de Heloisa Jahn. E uma curiosidade: “A autoestrada do sul” inspirou Jean-Luc Godard a criar o filme “Weekend”. Leia abaixo o trecho inicial do conto e depois assista ao trailer do filme de Godard:
Contos que estarão no livro A autoestrada do sul e outras histórias: “A casa tomada”, “O perseguidor”, “A porta condenada”, “Comportamento nos velórios”, “A autoestrada do Sul”, “Manuscrito achado num bolso”, “Tango de volta” e “A escola de noite”.
No começo a garota do Dauphine insistira em contabilizar o tempo, embora para o engenheiro do Peugeot 404 isso já não fizesse diferença. Qualquer um podia consultar o relógio mas era como se aquele tempo preso ao pulso direito ou o bip bip do rádio medissem outra coisa, fossem o tempo dos que não fizeram a besteira de querer voltar para Paris pela autoestrada do sul num domingo à tarde e, logo depois de sair de Fontainebleau, foram obrigados a diminuir a velocidade, parar, seis filas de cada lado (é sabido que nos domingos a autoestrada fica inteiramente reservada aos que regressam para a capital), ligar o motor, avançar três metros, parar, conversar com as duas freiras do 2HP da direita, com a garota do Dauphine à esquerda, olhar pelo retrovisor o homem pálido ao volante de um Caravelle, invejar ironicamente a felicidade avícola do casal do Peugeot 203 (atrás do Dauphine da garota), que se distrai com a filhinha e faz brincadeiras e come queijo, ou tolerar de tanto em tanto as manifestações exasperadas dos dois rapazinhos do Simca que precede o Peugeot 404, e mesmo descer do carro no topo da ladeira e explorar sem se afastar muito (porque nunca se sabe em que momento os carros lá da frente recomeçarão a avançar e será preciso correr para que os de trás não disparem a guerra das buzinas e dos insultos), e assim chegar à altura de um Taunus na frente do Dauphine da garota que verifica a hora a todo momento, e trocar algumas frases desalentadas ou espirituosas com os dois homens que viajam com o menino louro cujo maior divertimento nessas precisas circunstâncias consiste em fazer circular livremente seu carrinho de brinquedo sobre os assentos e o rebordo posterior do Taunus, ou ousar avançar mais um pouco, embora não pareça que os carros da frente estejam prestes a retomar a marcha, e contemplar com um pouco de pena o casal de velhos do id Citroën que parece uma gigantesca banheira roxa na qual sobrenadam os dois idosos, ele descansando os antebraços sobre o volante com ar de paciente cansaço, ela mordiscando uma maçã com mais aplicação que vontade.
Contos que estarão no livro A autoestrada do sul e outras histórias: “A casa tomada”, “O perseguidor”, “A porta condenada”, “Comportamento nos velórios”, “A autoestrada do Sul”, “Manuscrito achado num bolso”, “Tango de volta” e “A escola de noite”.
FALTA
FALTA LETRA NO ALFABETO
FALTA AFETO
EFETIVO EFEITO
DEFEITO PERFEITO
FALTA FETO
TATO TETO
SENTIMENTO NO VERSO
FALTA O REVERSO DO INVERSO
FALTA FET OU PET OU FLAT
FALTA FÉ
É...FALTA
FALT
FAL
FA
FUI.............................................
FALTA AFETO
EFETIVO EFEITO
DEFEITO PERFEITO
FALTA FETO
TATO TETO
SENTIMENTO NO VERSO
FALTA O REVERSO DO INVERSO
FALTA FET OU PET OU FLAT
FALTA FÉ
É...FALTA
FALT
FAL
FA
FUI.............................................
poema visual de Arnaldo Antunes abaixo
Acossados
ACOSSADOS
Brincávamos de gato e rato
entre fugas e adiados encontros
Estávamos mais do que prontos
maduros e maleáveis
e mesmo assim despreparados
insaciáveis e insociáveis
Cometíamos pequenos delitos
administrávamos conflitos
consistências e bobagens
Brincávamos de gato e rato
olhávamos os arredores
os cenários delineados
mas não ocupados de fato
Sabíamos que um gato tem sete vidas
e um rato mil fugas
previsíveis e insólitas escapulidas
e que ambas têm paixões prematuras
nos subterrâneos e nas alturas
e se expõe nas ruas
em fogem em telhados e tubos
buracos cavidades
as suas vidas se permeiam
em descontinuidades e fragmentações
e assim o imitávamos
brincando de gato e camundongo
prá não dizer rato rasteiro repugnante
prá rimar com bongos do Congo
ou tambores longos que interpretam banzos
Brincávamos de felino e roedor
enquanto um mostra as garras
as unhas de ataque e furor
o outro procura um canto qualquer
no rodapé
para proteger o inocente amor
que julga ter
E ambos acossados
pela posse e pelo desapego
em pelos eriçados
ou suavemente penteados pelo medo
mantinham todos os seus segredos
menos um
o desejo de encontro
em algum lugar
que possa ser incomum
um lugar que não possa incomodar
e acomodar agora e depois
o desejo de nós dois
Brincávamos de gato e rato
alternávamos as personagens
às vezes eu era o gato selvagem
dando pulos por aí
mimoso miando
quebrando telhados
enfeitiçando estrelas
às vezes eu era o o rato repelido
dando sustos por aí
Gritos inesperados
e a perseguição que parece
jamais terminar
Estamos predestinados
e mesmo acossados
sabemos que não podemos mudar
as nossas naturezas
e os nossos instintos
O gato comum
ou de raça
persa ou angorá
sempre feio será
a qualquer pássaro
e o rato apenas bonito
em um desenho animado
e a vida Tom e Jerry prossegue
em tom cinza e clima gélido da cidade
Um gato de cartola
que cometeu um recente delito
convida para assistir um filme de Godard
uma ratazana Bailarina
que mora no sebo ao lado...
e nem parecem ser
acossados
Brincávamos de gato e rato
entre fugas e adiados encontros
Estávamos mais do que prontos
maduros e maleáveis
e mesmo assim despreparados
insaciáveis e insociáveis
Cometíamos pequenos delitos
administrávamos conflitos
consistências e bobagens
Brincávamos de gato e rato
olhávamos os arredores
os cenários delineados
mas não ocupados de fato
Sabíamos que um gato tem sete vidas
e um rato mil fugas
previsíveis e insólitas escapulidas
e que ambas têm paixões prematuras
nos subterrâneos e nas alturas
e se expõe nas ruas
em fogem em telhados e tubos
buracos cavidades
as suas vidas se permeiam
em descontinuidades e fragmentações
e assim o imitávamos
brincando de gato e camundongo
prá não dizer rato rasteiro repugnante
prá rimar com bongos do Congo
ou tambores longos que interpretam banzos
Brincávamos de felino e roedor
enquanto um mostra as garras
as unhas de ataque e furor
o outro procura um canto qualquer
no rodapé
para proteger o inocente amor
que julga ter
E ambos acossados
pela posse e pelo desapego
em pelos eriçados
ou suavemente penteados pelo medo
mantinham todos os seus segredos
menos um
o desejo de encontro
em algum lugar
que possa ser incomum
um lugar que não possa incomodar
e acomodar agora e depois
o desejo de nós dois
Brincávamos de gato e rato
alternávamos as personagens
às vezes eu era o gato selvagem
dando pulos por aí
mimoso miando
quebrando telhados
enfeitiçando estrelas
às vezes eu era o o rato repelido
dando sustos por aí
Gritos inesperados
e a perseguição que parece
jamais terminar
Estamos predestinados
e mesmo acossados
sabemos que não podemos mudar
as nossas naturezas
e os nossos instintos
O gato comum
ou de raça
persa ou angorá
sempre feio será
a qualquer pássaro
e o rato apenas bonito
em um desenho animado
e a vida Tom e Jerry prossegue
em tom cinza e clima gélido da cidade
Um gato de cartola
que cometeu um recente delito
convida para assistir um filme de Godard
uma ratazana Bailarina
que mora no sebo ao lado...
e nem parecem ser
acossados
Carlos Roberto Gutierrez
Scrapp
que nada escape
nada intercepte
e tudo seja perceptível
cabelos sedas linhas e linhos
tijolos aparentes
tonalidades verdes
musgos
óculos aros visões e vestígios
echarpes ocres
cores em cumplicidade ou litígio
dedos alicerces
queixo e mangas caídos
que nada escape
nenhum som do ouvido
atento ou distraído
que nada escape das lentes
imagens presentes
visões futuristas
lembranças retorcidas
que tudo enverede verde
mesmo no azul mais cobalto e crível
nada intercepte
e tudo seja perceptível
cabelos sedas linhas e linhos
tijolos aparentes
tonalidades verdes
musgos
óculos aros visões e vestígios
echarpes ocres
cores em cumplicidade ou litígio
dedos alicerces
queixo e mangas caídos
que nada escape
nenhum som do ouvido
atento ou distraído
que nada escape das lentes
imagens presentes
visões futuristas
lembranças retorcidas
que tudo enverede verde
mesmo no azul mais cobalto e crível
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