Urbanóides cruzam o meu caminho
A cidade cresce
obedece os desígnios da metrópole
Abre-se mais uma rua
Quatro esquinas inéditas
a serem disputadas
por prostitutas mendingos
camelôs e pontos de venda de drogas
A cidade cresce
desenfreadamente
e paradoxalmente
o espaço diminui
e mais nos aborrece
com as suas areias movediças
ferros retorcidos
grades vulneráveis
cercas eletricas
cães turbinados
Mais uma rua...nasce já espúria
na fúria do trânsito...
Urbanóides cruzam o meu caminho!
Eu que sonhava lhe encontrar o mais rápido possível
vejo consternado
que o banco do jardim não mais existe
nem o próprio jardim
nenhuma pétala de lembrança sequer!
Mais uma rua
que se percebe turva
na reta ou na curva
na chuva de lágrimas...
a cidade que prevejo violenta
pelo estampido dos tiros
em seu escuro labirinto
que pressinto agitada
nos acertos de contas
nos desprezos e afrontas
Eu saí de casa há pouco tempo
prá não ficar louco e entediado
só para olhar o teto azul da noite
e contemplar o efeito discreto da opaca lua
e embaralhar as órbitas dos meus olhos
em estrelas
Eu saí de casa...transtornado
nem me lembro se fechei as janelas e as portas
Onde estão as minhas chaves?
Urbanóides cruzam o meu caminho!
Alguns se vestem sóbrios
com engomados pulsos e colarinhos
outros aparecem maltrapilhos
mostrando os seus rasgos e feridas
Uma pasta negra executiva passa mais depressa
que o seu dono
Um boné rebelde foge da cabeça do office boy
um pedaço de lingerie abraça desengonçado uma lata de lixo
um cão cobiça galinhas nuas na máquina de assar frangos
um recorte de notícias superadas
cobrem o corpo de um pedintes
policiais estouram um bingo clandestino
Urbanóides cortam o meu caminho!
Eu saí de casa
calcei o velho tênis
de cadarços largados
línguas de lona seca
estrelas desbotadas
sola quase sem pele de silicone
Onde amor você está?
me responde
Urbanóides cortam o meu caminho!
camuflei o tubo de spray
e procurei o muro possível
mas há tiras por todos os lados
assim como extorsões
de emoções e bens materiais
Bico calado! bico calado!
quero ao menos pichar o seu nome
Estou com fome!
vou entrar aqui mesmo
nesse bar ordinário
Será que há algo para comer
para forrar o estômago?
se não tiver
recorro ao meu âmago
amargo e experimento
o fermento cruel do fel do tormento
da selva de pedra
com os seus urbanóides
POEMA EM CONJUNTO
Desirée Gomes
Carlos Roberto Gutierrez
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